Monday, March 1, 2010

A Vívida Cidade.



Uma mulher ruiva veste uma cinta-liga vermelha, penteia os cabelos, puxa os seios para cima do corset, deixando-os expostos e belos. Passa o batom vermelho nos lábios se olhando no espelho. Borrifa três vezes o frasco de perfume que cái no seu colo, penetrando em sua pele e impregnando o quarto. Joga um sobretudo sobre os ombros, tira os cabelos compridos de dentro do casaco, os balança, veste seus óculos escuros, faz bico ao olhar no espelho antes de sair e passa pela porta, deixando apenas o perfume impregnado nas paredes.

Um senhor de idade senta em sua cadeira de balanço, de frente para a janela. Seus olhos são fixos no céu. As rugas são bem visíveis, tanto quanto seu cachimbo grande e marrom que segura entre o dedo indicador e o médio. Leva o cachimbo à boca, respira fundo, fecha os olhos.

Uma criança chora no quarto. Deitada na parte inferior de um beliche, ela esperneia e chuta o colchão que faz a cama toda se movimentar e tremer. Chora mais alto, grita, a garganta dói. Soluça e pede por sua mãe. Olha para a porta, pensando que alguém entrará e salvará sua vida. Ninguém vem. Grita novamente. Esperneia. O beliche balança.

Quatro mulheres tagarelam na cozinha. Uma mesa redonda, baralho, martinis. Uma conta que começou a trair seu marido, que a traía há muito tempo. Todas gritam com emoção e uma delas põe um disco de Neil Diamond na vitrola, com cuidado. As mulheres jogam as cartas para cima, levantam-se e dançam em volta da mesa redonda.

Um homem escreve uma carta para sua namorada que está longe. Escreve que precisa sentir o cheiro do seu cabelo, o gosto da sua boca, o toque da sua pele. Fala que necessita acordar e ter mais que ar ao seu lado. A caneta falha. Ele tenta fazê-la funcionar, mas é inútil. Fica nervoso, bravo. Rasga o papel. Joga a caneta para fora da janela. Segura a cabeça com as mãos e chora.

Sapatos vermelhos. Pernas brancas. Cabelos negros. Olhos castanhos. Pálpebras coloridas. Boca transparente e brilhosa. Checa o horário para tomar a pílula. Engole, com um gole d'água.

Um casal de namorados assiste "Brilho Eterno De Uma Mente Sem Lembranças". Mãos trançadas, olhos e mentes fixos na televisão. Se identificam com o filme. Dão risada, se emocionam. Ao final do filme, ele a beija na testa e pergunta se quer algo da geladeira. Ela pede um copo de água gelada. Ele pergunta se a madame quer mais alguma coisa. Ela diz: "Você".

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